Os limites da vingança


Se achamos que já vimos tudo sobre violência, podemos começar a duvidar depois de assistir a Doce Vingança, uma chocante filmagem sobre retaliação. O filme começa mostrando Jennifer Hills, jovem escritora, que vai passar um tempo em uma cabana numa cidade pequena. Seu desejo é ter sossego para escrever seu novo livro.
Soa estranho que uma mulher não se dê conta do perigo que é ir sozinha a um lugar ermo, onde qualquer um que queira assalta-la ou agredi-la poderá entrar facilmente na casa, sem que ela tenha muitas chances de se defender ou pedir ajuda.
Enquanto escreve, Jennifer é observada por alguns homens que moram na cidade. Eles acabam por invadir sua casa e assustá-la. Ela consegue escapar e vai pedir ajuda ao xerife da cidade. Ele vai com ela verificar e a moça tem uma triste surpresa: ele é amigo dos invasores. Assim, os cinco homens começam a fazer algo terrível e brutal. O que se segue é uma sucessão de cenas capaz de causar mal-estar ao espectador menos sensível, levando-o a virar o rosto. Os homens a estupram, humilham e torturam. Eles ainda filmam a agressão. Ver pessoas capazes de se deleitar em causar dor a outro ser humano é um verdadeiro desafio à nossa resistência. As cenas são lentas, mostrando toda a brutalidade a que Jennifer é submetida de forma crua e insuportavelmente detalhada.
É incrível ver a covardia dos agressores. Ao final, nua e machucada, Jennifer consegue escapar e se joga no rio. Os homens temem que ela possa ter sobrevivido e, nos dias seguintes, preocupam-se exclusivamente em destruir as evidências do crime para fazer parecer que ela saiu da cidade.
Porém, sua tranquilidade não dura muito. Alguém manda à casa do xerife uma fita com a agressão gravada. O xerife, homem bem-casado, pai carinhoso e frequentador da igreja, quer sabem quem mandou aquilo e fica desesperado. Um ponto interessante do filme é o de sua filha se chamar "Chastity” que em inglês significa castidade. Soa irônico que alguém capaz de estuprar uma mulher de forma tão sádica tenha uma filha com tal nome.
Nesse desenrolar dos acontecimentos, Jennifer reaparece. Sua volta é um verdadeiro furo do roteiro. Ao fugir, estava nua e suja. E volta com roupas limpas e aparência de quem acabou de tomar um banho. Onde conseguiu as roupas? De que maneira sobreviveu? Bem, o filme não se preocupará em esclarecer essas perguntas. O que as cenas seguintes se encarregarão de mostrar será uma nova Jennifer, disposta a se vingar das violências sofridas. E ela tomará atitudes extremas, capazes de levantar questões de natureza moral sobre até onde vão os limites da vingança e as crueldades de que os seres humanos são capazes, seja por prazer ou para dar o troco.
Jennifer não tem a menor pressa em se vingar. Planejou tudo metodicamente e com muita calma e frieza para ter a certeza de que os criminosos sofrerão como ela sofreu. Ver sua vingança é um desafio à nossa resistência. Ela acaba por cometer atrocidades inacreditáveis para infligir dor. Uma mensagem vai ficando subentendida: monstruosidade se combate com monstruosidade. Por que ela não usou a gravação para procurar as autoridades e levar os estupradores à Justiça? Isso com certeza iria desmoralizar os criminosos e não a deixaria com as mãos sujas de sangue. No final, ela se tornou um monstro. Ficou com o peso de cinco mortes nas costas. E isso lhe diminuirá a dor? O que ela fará depois para se livrar dos corpos e como sumirá com as provas dos crimes? Na vida real, ela perderia a paz e seria descoberta e presa. Qual a compensação em cometer tamanha crueldade?
Terminando de assistir, nós ficamos com dúvidas sobre se há limites para a nossa capacidade de ser cruéis para com os outros seres humanos. Talvez não haja limites dentro de uma mente cruel.

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